sábado, 28 de julho de 2018

Se as suas emoções pudessem traduzir-se em palavras, seria assim: Por causa da nota que tocas na cabeça,  por causa das paredes que tens nos olhos,  por causa das cicatrizes todas na tua pele,  das rosas e da tristeza,  por causa do coelho que está sempre a morrer,  por causa do frio que sinto ao chegar a quatro centímetros da tua presença,  por causa das traças que voam à nossa volta,  por causa dos sonhos que ainda não cumpri e porque me sinto sozinho como se estivesse pendurado no meio do Universo,  preso a uma estrela muito distante,  tão distante que não se pode ver a olho nu, nem nenhum astronauta lá chega, nem os olhos dos telescópios.  Mas Tristan não saberia verbalizar assim as suas emoções,  portanto :
- Porque ainda não fiz os trabalhos de casa.
- E de que estás à espera?
Se Tristan soubesse verbalizar as emoções, seria assim: Estou à espera de que a felicidade comece a crescer como os bebés no útero das mães e que um dia nasça e chore e queira mamar e nós eduquemos a felicidade e a levemos à escola para que saiba ler as letras das nossas veias e fazer contas de multiplicar com a nossa saliva,  estou à espera de um beijo daqueles que são dirigidos somente a uma pessoa,  e não daqueles que se dão a pensar em alguém que está longe  (...)

Afonso Cruz,  " Nem todas as baleias voam "