segunda-feira, 27 de julho de 2009

pedaços de silêncio

Um dia em que tive um grande desgosto, deitei-me para dormir sem saber como seria a minha vida para diante. Quando acordei, olhei-me ao espelho e vi, espantado, que duas grandes rugas me tinham nascido nessa noite, junto aos olhos. Não estavam lá antes de eu me ter deitado na véspera, mas agora estavam, nítidas e verdadeiras, a menos que eu as injectasse de botox e alguém inventasse uma cirurgia contra os desgostos. E habituei-me às rugas, conformei-me com o tempo que passa. Às vezes, lá onde moro, fico à noite a olhar as estrelas como as do deserto e oiço o tempo a passar, mas não me angustia mais: eu sei que é justo e que tudo o resto é falso. E às vezes, nesse terraço onde vejo e oiço as estrelas, onde escuto e aceito a ampulheta da minha vida, acendo um lume à maneira do Ali, com os galhos e ramos secos que fui colhendo durante o dia, ao passear pela paisagem. E, às vezes também, quando então percebo que tudo está em paz e faz sentido, falo com a tua estrela, sei que tu me guardas e vigias, que perdoas todos estes anos de silêncio, tão cruéis e irreparáveis ausências, tanto medo de seguir a tua estrela [...], a tua luz, em vez de tantas ofuscantes ilusões.
(No teu deserto, MST)

1 comentário:

fr disse...

é brutal este texto, não é? é brutal de tão verdade!! bjs